
Os Jars são um trio com raízes em Itália, Croácia e Eslovénia, focado em música livremente improvisada e em free jazz, formado por Henry Marić no clarinete baixo, clarinete e guitarra eléctrica, Boris Janje no contrabaixo, e Stefano Giust na percussão. Este é, portanto, à semelhança dos Ombak Trio, mais um projecto em que o prolífico percussionista Stefano Giust se junta a dois outros músicos para explorar música não convencional, respeitando assim a tradição da editora Setola di Maiale de se aventurar por “investigações na música experimental e improvisada”. E muito bem que o tem feito - verdade seja dita -, dado que desde 1993, ano de criação desta chancela italiana, já editou mais de quatro centenas de álbuns – um número espantoso e inquestionavelmente respeitável!
A música deste álbum de estreia dos Jars é de difícil definição no que toca a forma, mas porventura mais fácil de definir em termos de conteúdo. A primeira escapa-nos, muitas vezes, por entre os dedos das mãos, qual água líquida que tentamos, de modo infortuito, agarrar para compreender. Afinal, estamos perante material amorfo, altamente abstracto, fruto de improvisação livre e espontânea. Porventura uma excepção a esta apreciação seja o quinto tema - “Slon živaca” -, no qual se escuta o trio a embarcar num explícito 4/4 - definido por Giust e marcado nos tempos fortes por Janje -, que se pode considerar um tema de estrutura tradicional: um motivo é apresentando, ocorrem variações sobre o mesmo, atinge-se um clímax, e, por fim, regressa-se ao tema inicial. Tudo o resto é amorfo, com o trio a dedicar-se maioritariamente à criação de paisagens e imagens opacas, assim como à representação sonora de pensamentos e sensações. Por outro lado, em relação ao conteúdo, serão talvez mais evidentes algumas das intenções do grupo. Em “Oped mravi”, “Jazzavac u kuhinji”, “Avtobus” ou “Pijeta”, o grupo apresenta-se com Marić no clarinete, configuração que tende a levar o trio a explorar territórios mais próximos do free jazz, mantendo alguma coerência melódica e entrosamento harmónico. Marić é um clarinetista de grande profundidade e que recorre amiúde a notas longas que criam uma atmosfera arrastada e contemplativa. Já Janje possui um fraseado atómico, preferindo o staccato ao legato, quase sempre tocando o contrabaixo com os dedos, usando o arco apenas para específicas intervenções (ouça-se, por exemplo, “Mačkaste kocke” ou “Stara Kuina”). Por fim, Giust é uma percussionista altamente versátil e expressivo, sempre presente, e que possui a extraordinária habilidade de ser imensamente comunicativo sem que, apesar disso, se torne intrusivo. De notar, também, que a verdadeira abstracção do concreto ocorre quando Marić troca o clarinete pela guitarra – como, por exemplo, acontece em “Mackaste kocke” -, transição que propulsiona o trio a divagar por paisagens indefinidas e cabalmente experimentais. “Okleto” é uma outra dessas instâncias, este que é um tema que investiga a disrupção do silêncio através de um jogo calculista, no qual sucessivas intervenções dos músicos destroem por instantes a serenidade da ausência de sons.
Como a física de Albert Einstein e a escrita de Antonin Artaud serviram de inspiração à bonita arte apresentada na capa do disco, caracterizemos este disco como um método anárquico de exploração sónica… científico ou não, é bem bonito de se ouvir.